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sexta-feira, 29 de janeiro de 2016

A Cidade Sitiada - Livro de Paulo Tabatinga

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via depósito bancário
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segunda-feira, 13 de abril de 2015

 AMÉRICA LATINA PERDE EDUARDO GALEANO


O escritor e jornalista uruguaio, autor de livros emblemáticos como “As veias abertas da América Latina”, “Memória do Fogo” e “O Livro dos Abraços”, faleceu nesta segunda-feira, 13 de abril, em Montevidéu, aos 74 anos. O juri que lhe entregou o doutorado honoris causa da Universidade de Havana, em 2001, o definiu como “um recuperador da memória real e coletiva sul-americana e um cronista do seu tempo”.
Eduardo Germán Hughes Galeano nasceu em Montevidéu, no dia 3 de setembro de 1940. Era filho de Eduardo Hughes Roosen e de Lucía Ester Galeano Muñoz, de quem tomou o sobrenome para assinar como escritor e jornalista. Quando era um adolescente, começou a publicar caricaturas no El Sol, um pasquim socialista do Uruguai, com o pseudônimo de Gius. Apesar de ser oriundo de uma família de classe alta, ele trabalhou como operário numa fábrica de inseticidas e pintor de cartazes, entre outros ofícios.
Seus primeiros passos no jornalismo foram no início dos Anos 60, como editor do semanário Marcha e do diário Época. Depois do golpe de Estado em seu país, no dia 27 de junho de 1973, foi preso, mas libertado posteriormente, e então se instalou na Argentina. Em Buenos Aires, foi diretor da revista cultural e política Crisis, fundada por Federico Vogelius (1919-1986): “aquele foi um grande exercício de fé na palavra humana, solidária e criadora (….) por acreditar na palavra, nessa palavra, Crisis escolheu o silêncio. Quando a ditadura militar a proibiu de dizer o que ela tinha que dizer, se negou a seguir falando”, disse anos depois sobre o fechamento da publicação, que aconteceu em agosto de 1976.
A ditadura argentina, presidida por Jorge Rafael Videla, colocou seu nome numa lista negra de condenados políticos, o que o obrigou a se exilar na Espanha. Ali, ele escreve a trilogia Memória do Fogo (Os Nascimentos, 1982; As Caras E As Máscaras, 1984 e O Século Do Vento, 1986) onde revisita a história do continente latino-americano.
Cronista do seu tempo, a visão de uma América Latina unida foi refletida em sua narrativa, através de obras como Los Días Siguientes (1963) (não tem título em português), Vagamundo (1973), O Livro dos Abraços (1989), Patas Arriba: La Escuela del Mundo al Revés (1998) (não tem título em português).
Em 1985, regressou a Montevidéu, quando Julio María Sanguinetti assumiu a presidência do país através de eleições democráticas. De volta ao seu país natal, juntou-se com Mario Benedetti, Hugo Alfaro e outros escritores e jornalistas para fundar o semanário Brecha. Posteriormente, criou sua própria editora: El Chanchito. Ademais, integrou a Comissão Nacional Pró Referendo (entre 1987 e 1989), constituída para derrubar a Lei de Anistia, promulgada em dezembro de 1986, para impedir o julgamento de crimes cometidos durante a ditadura militar em seu país (1973-1985).
A obra de Eduardo Galeano recebeu galardões em diversas partes do mundo, como o Prêmio Casa das Américas, em 1975 e 1978, o Prêmio do Ministério da Cultura do Uruguai em 1982, 1984 e 1986, o American Book Award de 1989, o Prêmio Stig Dagerman de 2010 e o Prêmio Alba das Letras, em 2013.
Quando recebeu o doutorado Honoris Causa da Universidade de Havana, em 2001, o escritor disse: “Eu amei esta ilha da única maneira que é, digna de fé, com suas luzes e sombras”, enquanto o juri definiu o escritor e jornalista com a certeza de se tratar de “um recuperador da memória real e coletiva sul-americana e um cronista do seu tempo”.
Em 2004, escreveu uma “Carta ao Senhor Futuro”, que sintetiza seus anseios. “Estamos ficando sem mundo. Os violentos chutam ele como se fosse uma bola. Jogam com ele, esses senhores da guerra, como se ele fosse uma granada de mão; e os mais vorazes o espremem como um limão. Nesse passo, temo que, mais cedo que tarde, o mundo poderia não ser mais que uma pedra morta girando no espaço, sem terra, sem água, sem ar e sem alma”, advertiu o escritor nessa carta. “Disso se trata, senhor Futuro. Eu lhe peço, nós lhe pedimos, que não se deixe desalojar. Para estarmos, para sermos, necessitamos que o senhor siga estando, que o senhor siga sendo, que nos ajude a defender sua casa, que é a casa do tempo”.

(FONTE: http://cartamaior.com.br/?/Editoria/Internacional/Morre-o-escritor-Eduardo-Galeano/6/33255)




Poesiartemanhas

Mundo Mercadológico

No mundo mecardo(lógico)
e desprovido de sentimentos
eu sou apenas pré-juizo
       Paulo Tabatinga




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Filosofando 






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Gomes Brasil 
https://www.youtube.com/watch?v=LS_qY3E9AvI 

sexta-feira, 6 de fevereiro de 2015

Žižek: Pensar o atentado ao Charlie Hebdo

 Por Slavoj Žižek.*

É agora – quando estamos todos em estado de choque depois da carnificina na sede do Charlie Hebdo – o momento certo para encontrar coragem para pensar. Agora, e não depois, quando as coisas acalmarem, como tentam nos convencer os proponentes da sabedoria barata: o difícil é justamente combinar o calor do momento com o ato de pensar. Pensar quando o rescaldo dos eventos esfriar não gera uma verdade mais balanceada, ela na verdade normaliza a situação de forma a nos permitir evitar as verdades mais afiadas.
Pensar significa ir adiante do pathos da solidariedade universal que explodiu nos dias que sucederam o evento e culminaram no espetáculo de domingo, 11 de janeiro de 2015, com grandes nomes políticos ao redor do globo de mãos dadas, de Cameron a Lavrov, de Netanyahu a Abbas – talvez a imagem mais bem acabada da falsidade hipócrita. O verdadeiro gesto Charlie Hebdo seria ter publicado na capa do semanário uma grande caricatura brutal e grosseiramente tirando sarro desse evento, com cartuns de Netanyahu e Abbas, Lavrov e Cameron, e outros casais se abraçando e beijando intensamente enquanto afiam facas por trás de suas costas.
Devemos, é claro, condenar sem ambiguidade os homicídios como um ataque contra a essência das nossas liberdades, e condená-los sem nenhuma ressalva oculta (como quem diria “mas Charlie Hebdo estava também provocando e humilhando os muçulmanos demais”). Devemos também rejeitar toda abordagem calcada no efeito mitigante do apelo ao “contexto mais amplo”: algo como, “os irmãos terroristas eram profundamente afetados pelos horrores da ocupação estadunidense do Iraque” (OK, mas então por que não simplesmente atacaram alguma instalação militar norte-americana ao invés de um semanário satírico francês?), ou como, “muçulmanos são de fato uma minoria explorada e escassamente tolerada” (OK, mas negros afro-descendentes são tudo isso e mais e no entanto não praticam atentados a bomba ou chacinas), etc. etc. O problema com tal evocação da complexidade do pano de fundo é que ele pode muito bem ser usado a propósito de Hitler: ele também coordenou uma mobilização diante da injustiça do tratado de Versalhes, mas no entanto era completamente justificável combater o regime nazista com todos os meios à nossa disposição. A questão não é se os antecedentes, agravos e ressentimentos que condicionam atos terroristas são verdadeiros ou não, o importante é o projeto político-ideológico que emerge como reação contra injustiças.
Nada disso é suficiente – temos que pensar adiante. E o pensar de que falo não tem absolutamente nada a ver com uma relativização fácil do crime (o mantra do “quem somos nós ocidentais, que cometemos massacres terríveis no terceiro mundo, para condenar atos como estes?”). E tem menos ainda a ver com o medo patológico de tantos esquerdistas liberais ocidentais de sentirem-se culpados de islamofobia. Para estes falsos esquerdistas, qualquer crítica ao Islã é rechaçada como expressão da islamofobia ocidental: Salman Rushdie foi acusado de ter provocado desnecessariamente os muçulmanos, e é portanto responsável (ao menos em parte) pelo fatwa que o condenou à morte etc.
O resultado de tal postura só pode ser esse: o quanto mais os esquerdistas liberais ocidentais mergulham em seu sentimento de culpa, mais são acusados por fundamentalistas muçulmanos de serem hipócritas tentando ocultar seu ódio ao Islã. Esta constelação perfeitamente reproduz o paradoxo do superego: o quanto mais você obedece o que o outro exige de você, mais culpa sentirá. É como se o quanto mais você tolerar o Islã, tanto mais forte será sua pressão em você…
É por isso que também me parecem insuficientes os pedidos de moderação que surgiram na linha da alegação de Simon Jenkins (no The Guardian de 7 de janeiro) de que nossa tarefa seria a de “não exagerar a reação, não sobre-publicizar o impacto do acontecimento. É tratar cada evento como um acidente passageiro do horror” – o atentado ao Charlie Hebdo não foi um mero “acidente passageiro do horror”. Ele seguiu uma agenda religiosa e política precisa e foi como tal claramente parte de um padrão muito mais amplo. É claro que não devemos nos exaltar – se por isso compreendermos não sucumbir à islamofobia cega – mas devemos implacavelmente analisar este padrão.
O que é muito mais necessário que a demonização dos terroristas como fanáticos suicidas heroicos é um desmascaramento desse mito demoníaco. Muito tempo atrás, Friedrich Nietzsche percebeu como a civilização ocidental estava se movendo na direção do “último homem”, uma criatura apática com nenhuma grande paixão ou comprometimento. Incapaz de sonhar, cansado da vida, ele não assume nenhum risco, buscando apenas o conforto e a segurança, uma expressão de tolerância com os outros: “Um pouquinho de veneno de tempos em tempos: que garante sonhos agradáveis. E muito veneno no final, para uma morte agradável. Eles têm seus pequenos prazeres de dia, e seus pequenos prazeres de noite, mas têm um zelo pela saúde. ‘Descobrimos a felicidade,’ dizem os últimos homens, e piscam.”
Pode efetivamente parecer que a cisão entre o Primeiro Mundo permissivo e a reação fundamentalista a ele passa mais ou menos nas linhas da oposição entre levar uma longa e gratificante vida cheia de riquezas materiais e culturais, e dedicar sua vida a alguma Causa transcendente. Não é esse o antagonismo entre o que Nietzsche denominava niilismo “passivo” e “ativo”? Nós no ocidente somos os “últimos homens” nietzschianos, imersos em prazeres cotidianos banais, enquanto os radicais muçulmanos estão prontos a arriscar tudo, comprometidos com a luta até sua própria autodestruição. O poema “The Second Comming” [O segundo advento], de William Butler Yeats parece perfeitamente resumir nosso predicamento atual: “Os melhores carecem de toda convicção, enquanto os piores são cheios de intensidade apaixonada”. Esta é uma excelente descrição da atual cisão entre liberais anêmicos e fundamentalistas apaixonados. “Os melhores” não são mais capazes de se empenhar inteiramente, enquanto “os piores” se empenham em fanatismo racista, religioso e machista.
No entanto, será que os terroristas fundamentalistas realmente se encaixam nessa descrição? O que obviamente lhes carece é um elemento que é fácil identificar em todos os autênticos fundamentalistas, dos budistas tibetanos aos amistas nos EUA: a ausência de ressentimento e inveja, a profunda indiferença perante o modo de vida dos não-crentes. Se os ditos fundamentalistas de hoje realmente acreditam que encontraram seu caminho à Verdade, por que deveriam se sentir ameaçados por não-crentes, por que deveriam invejá-los? Quando um budista encontra um hedonista ocidental, ele dificilmente o condena. Ele só benevolentemente nota que a busca do hedonista pela felicidade é auto-derrotante. Em contraste com os verdadeiros fundamentalistas, os pseudo-fundamentalistas terroristas são profundamente incomodados, intrigados, fascinados pela vida pecaminosa dos não-crentes. Tem-se a sensação de que, ao lutar contra o outro pecador, eles estão lutando contra sua própria tentação.
É aqui que o diagnóstico de Yeats escapa ao atual predicamento: a intensidade apaixonada dos terroristas evidencia uma falta de verdadeira convicção. O quão frágil não tem de ser a crença de um muçulmano para que ele se sinta ameaçado por uma caricatura besta em um semanário satírico? O terror islâmico fundamentalista não é fundado na convicção dos terroristas de sua superioridade e em seu desejo de salvaguardar sua identidade cultural-religiosa diante da investida da civilização global consumista.
O problema com fundamentalistas não é que consideramos eles inferiores a nós, mas sim que eles próprios secretamente se consideram inferiores. É por isso que nossas reafirmações politicamente corretas condescendentes de que não sentimos superioridade alguma perante a eles só os fazem mais furiosos, alimentando seu ressentimento. O problema não é a diferença cultural (seu empenho em preservar sua identidade), mas o fato inverso de que os fundamentalistas já são como nós, que eles secretamente já internalizaram nossas normas e se medem a partir delas. Paradoxalmente, o que os fundamentalistas verdadeiramente carecem é precisamente uma dose daquela convicção verdadeiramente “racista” de sua própria superioridade.
As recentes vicissitudes do fundamentalismo muçulmano confirmam o velho insight benjaminiano de que “toda ascensão do fascismo evidencia uma revolução fracassada”: a ascensão do fascismo é a falência da esquerda, mas simultaneamente uma prova de que havia potencial revolucionário, descontentamento, que a esquerda não foi capaz de mobilizar.
E o mesmo não vale para o dito “islamo-fascismo” de hoje? A ascensão do islamismo radical não é exatamente correlativa à desaparição da esquerda secular nos países muçulmanos? Quando, lá na primavera de 2009, o Taliban tomou o vale do Swat no Paquistão, o New York Times publicou que eles arquitetaram uma “revolta de classe que explora profundas fissuras entre um pequeno grupo de proprietários abastados e seus inquilinos sem terra”. Se, no entanto, ao “tirar vantagem” da condição dos camponeses, o Taliban está “chamando atenção para os riscos ao Paquistão, que permanece em grande parte feudal”, o que garante que os democratas liberais no Paquistão, bem como os EUA,  também não “tirem vantagem” dessa condição e procurem ajudar os camponeses sem terra? A triste implicação deste fato é que as forças feudais no Paquistão são os “aliados naturais” da democracia liberal…
Mas como ficam então os valores fundamentais do liberalismo (liberdade, igualdade, etc.)? O paradoxo é que o próprio liberalismo não é forte o suficiente para salvá-los contra a investida fundamentalista. O fundamentalismo é uma reação – uma reação falsa, mistificadora, é claro – contra uma falha real do liberalismo, e é por isso que ele é repetidamente gerado pelo liberalismo. Deixado à própria sorte, o liberalismo lentamente minará a si próprio – a única coisa que pode salvar seus valores originais é uma esquerda renovada. Para que esse legado fundamental sobreviva, o liberalismo precisa da ajuda fraterna da esquerda radical. Essa é a única forma de derrotar o fundamentalismo, varrer o chão sob seus pés.
Pensar os assassinatos de Paris significa abrir mão da auto-satisfação presunçosa de um liberal permissivo e aceitar que o conflito entre a permissividade liberal e o fundamentalismo é essencialmente um falso conflito – um círculo vicioso de dois polos gerando e pressupondo um ao outro. O que Max Horkheimer havia dito sobre o fascismo e o capitalismo já nos anos 1930 – que aqueles que não estiverem dispostos a falar criticamente sobre o capitalismo devem se calar sobre o fascismo – deve ser aplicada também ao fundamentalismo de hoje: quem não estiver disposto a falar criticamente sobre a democracia liberal deve também se calar sobre o fundamentalismo religioso.
* Texto enviado pelo autor ao Blog da Boitempo. A tradução é de Artur Renzo. Uma versão encurtada deste artigo foi publicada em inglês no New Statesman em 10 de janeiro de 2015




Foto da semana

 

Mafuá - Teresina 2015

 


Poesiartemanhas


madrugada é solidão

com saudade do sol

 

( Paulo Tabatinga )

 

 

Filosofando em português

 

no mundo mercado(lógico)

eu sou apenas pré-juízo

 

(Paulo Tabatinga)

 

 

Fotopoema

 


Música que eu gosto

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domingo, 21 de abril de 2013

Voltando...


Cantiga Sua Partindo-se
de João Ruiz de Castelo Branco
Trata-se da composição mais conhecida do Cancioneiro Geral.

Ao contrário das cantigas do trovadorismo, não é necessário traduzir para o português moderno. Não se trata mais do dialeto galeco-português, mas da língua portuguesa arcaica, anterior à sistematização ocorrida no período clássico.

Cantiga sua Partindo-se é amplamente conhecida e apreciada, na qual a limpidez da linguagem e os achados expressivos servem de coro a uma primorosa síntese do lancinante sentimento de amar e ter de partir, num clima de quase elegia, tão mortificante o sofrimento que no poema se confessa: o ritmo, determinado por uma melopéia propositadamente monótona e plangente qual cantilena, ondulante e reticente, colabora com eficácia para conferir aos versos um ar de mistério e fugacidade, motivo suficiente para fazê-los de permanente agrado do leitor de poesia.

Cantiga sua partindo-se

Senhora, partem tam tristes
meus olhos por vós, meu bem,
que nunca tam tristes vistes
outros nenhuns por ninguém.

Tam tristes, tam saudosos,
tam doentes da partida,
tam cansados, tam chorosos
da morte mais desejosos
cem mil vezes que da vida.

Partem tam tristes os tristes,
tam fora d'esperar bem,
que nunca tam tristes vistes
outros nenhuns por ninguém.



Foto da Semana





Poesiartemanhas

Vagabundagem
- Arthur Rimbaud
- Tradução: Ferreira Gullar

Lá ia eu com as mãos em meus bolsos furados;
O paletó também se tornara irreal;
E sob aquele céu, Musa! eu era teu vassalo;
E imaginava amores nunca imaginados!

Nas calças um buraco e eu só tinha aquelas.
- Pequeno Polegar das rimas, sonhador,
Instalei meu albergue na Ursa Maior.
- Lá no céu o frufru de seda das estrelas...

Eu as ouvia, sentado à beira das estradas,
nas noites boas de setembro, quando o orvalho
revigorava-me a fronte como um vinho;

E em meio às sombras fantásticas, então,
dedilhava, como se fossem lira, os elásticos
de meus sapatos, o pé junto do coração



Filosofando

“Lá vão os ladrões grandes a enforcar os pequenos” Diógenes ( no texto, sermão do bom ladrão – Padre Viera)



Video Transtabatinga






Fotopoema:

domingo, 20 de maio de 2012

Triste história de um Professor

Porto Alegre (RS), 16 de julho de 2011

Caro Juremir (CORREIO DO POVO/POA/RS)

Meu nome é Maurício Girardi. Sou Físico. Pela manhã sou vice-diretor no Colégio Estadual Piratini, em Porto Alegre , onde à noite leciono a disciplina de Física para os três anos do Ensino Médio. Pois bem, olha só o que me aconteceu: estou eu dando aula para uma turma de segundo ano. Era 21/06/11 e, talvez, “pela entrada do inverno”, resolveu também ir á aula uma daquelas “alunas-turista” que aparecem vez por outra para  “fazer uma social”.  Para rever os conhecidos. 
Por três vezes tive que pedir licença para a mocinha para poder explicar o conteúdo que abordávamos. Parece que estão fazendo um favor em nos permitir um espaço de fala. Eis que após insistentes pedidos, estando eu no meio de uma explicação que necessitava de bastante atenção de todos, toca o celular da aluna, interrompendo todo um processo de desenvolvimento de uma idéia e prejudicando o andamento da aula. Mudei o tom do pedido e aconselhei aquela menina que, se objetivo dela não era o de estudar, então que procurasse outro local, que fizesse um curso à distância ou coisa do gênero, pois ali naquela sala estavam pessoas que queriam aprender' e que o Colégio é um local aonde se vai para estudar. Então, a “estudante” quis argumentar, quando falei que não discutiria mais com ela.
 
Neste momento tocou o sinal e fui para a troca de turma. A menina resolveu ir embora e desceu as escadas chorando por ter sido repreendida na frente de colegas. De casa, sua mãe ligou para a Escola e falou com o vice-diretor da noite, relatando que tinha conhecidos influentes em Porto Alegre e que aquilo não iria ficar assim. Em nenhum momento procurou escutar a minha versão nem mesmo para dizer, se fosse o caso, que minha postura teria sido errada. Tampouco procurou a diretoria da Escola.
Qual passo dado pela mãe?  Polícia Civil!... Isso mesmo!... tive que comparecer no dia 13/07/11, na  8.ª (oitava Delegacia de Polícia de Porto Alegre) para prestar esclarecimentos por ter constrangido (“?”) uma adolescente (17 anos), que muito pouco frequenta as aulas e quando o faz é para importunar, atrapalhar seus colegas e professores'. A que ponto que chegamos? Isso é um desabafo!... Tenho 39 anos e resolvi ser professor porque sempre gostei de ensinar, de ver alguém se apropriar do conhecimento e crescer. Mas te confesso, está cada vez mais difícil.
 
Sinceramente, acho que é mais um professor que o Estado perde. Tenho outras opções no mercado. Em situações como essa, enxergamos a nossa fragilidade frente ao sistema. Como leitor da tua coluna, e sabendo que abordas com frequência temas relacionados à educação, ''te peço, encarecidamente, que dediques umas linhas a respeito da violência que é perpetrada contra os professores neste país''.
Fica cristalina a visão de que, neste país:

Ø  NÃO PRECISAMOS DE PROFESSORES                  
Ø  NÃO PRECISAMOS DE EDUCAÇÃO
Ø  AFINAL, PARA QUE SER UM PAÍS DE 1° MUNDO SE ESTÁ BOM ASSIM ?


Foto da Semana

Segundo os grevistas que se sentiram traídos: a maoiria das greves, aqui em Teresina, é abafada pela mídia comprometida com o capitalismo excludente e protetor , é claro, da elite. pena que a maioria das pessoas está entretida de frente para a televisão, e não vê ou finge não ver os acontecimemtos reais.


Fotopoema


Poemartemanha

Cântico negro
José Régio

"Vem por aqui" — dizem-me alguns com os olhos doces
Estendendo-me os braços, e seguros
De que seria bom que eu os ouvisse
Quando me dizem: "vem por aqui!"
Eu olho-os com olhos lassos,
(Há, nos olhos meus, ironias e cansaços)
E cruzo os braços,
E nunca vou por ali...
A minha glória é esta:
Criar desumanidades!
Não acompanhar ninguém.
— Que eu vivo com o mesmo sem-vontade
Com que rasguei o ventre à minha mãe
Não, não vou por aí! Só vou por onde
Me levam meus próprios passos...
Se ao que busco saber nenhum de vós responde
Por que me repetis: "vem por aqui!"?
Prefiro escorregar nos becos lamacentos,
Redemoinhar aos ventos,
Como farrapos, arrastar os pés sangrentos,
A ir por aí...
Se vim ao mundo, foi
Só para desflorar florestas virgens,
E desenhar meus próprios pés na areia inexplorada!
O mais que faço não vale nada.
Como, pois, sereis vós
Que me dareis impulsos, ferramentas e coragem
Para eu derrubar os meus obstáculos?...
Corre, nas vossas veias, sangue velho dos avós,
E vós amais o que é fácil!
Eu amo o Longe e a Miragem,
Amo os abismos, as torrentes, os desertos...
Ide! Tendes estradas,
Tendes jardins, tendes canteiros,
Tendes pátria, tendes tetos,
E tendes regras, e tratados, e filósofos, e sábios...
Eu tenho a minha Loucura !
Levanto-a, como um facho, a arder na noite escura,
E sinto espuma, e sangue, e cânticos nos lábios...
Deus e o Diabo é que guiam, mais ninguém!
Todos tiveram pai, todos tiveram mãe;
Mas eu, que nunca principio nem acabo,
Nasci do amor que há entre Deus e o Diabo.
Ah, que ninguém me dê piedosas intenções,
Ninguém me peça definições!
Ninguém me diga: "vem por aqui"!
A minha vida é um vendaval que se soltou,
É uma onda que se alevantou,
É um átomo a mais que se animou...
Não sei por onde vou,
Não sei para onde vou
Sei que não vou por aí!

José Régio
pseudônimo literário de José Maria dos Reis Pereira, nasceu em Vila do Conde em 1901. Licenciado em Letras em Coimbra, ensinou durante mais de 30 anos no Liceu de Portalegre. Foi um dos fundadores da revista "Presença", e o seu principal animador. Romancista, dramaturgo, ensaísta e crítico, foi, no entanto, como poeta. que primeiramente se impôs e a mais larga audiência depois atingiu. Com o livro de estréia — "Poemas de Deus e do Diabo" (1925) — apresentou quase todo o elenco dos temas que viria a desenvolver nas obras posteriores: os conflitos entre Deus e o Homem, o espírito e a carne, o indivíduo e a sociedade, a consciência da frustração de todo o amor humano, o orgulhoso recurso à solidão, a problemática da sinceridade e do logro perante os outros e perante a si mesmos.

Filosofando

“ A voz do intelecto é suave, mas termina por se fazer ouvir”  Freud


Acontecendo Em Teresina

Oficina da Palavra promove exposição “As cores da Serra Vermelha”



Nesta terça-feira, 22 de maio, às 20h, será realizado coquetel de abertura da exposição “As cores da Serra Vermelha” do fotógrafo, jornalista e ambientalista André Pessoa, na Oficina da Palavra.
No evento, será lançado o site “Piauí Sempre Verde”, coordenado por André Pessoa, que terá como foco aspectos ambientais do estado do Piauí A exposição propõe um novo olhar sobre uma das questões mais polêmicas do nosso estado:  Serra Vermelha, enfatizando suas belezas e seus problemas.

quarta-feira, 9 de maio de 2012

tão teresina, que dói / cineas santos


Ao poeta Paulo Machado

______Era um tempo sem colheita / mas havia a crença:/ viver não doía tanto. Bem que poderia ter sido assim; não foi. Numa manhã de cristal, dessas que só acontecem em Teresina, fui literalmente despejado na Praça Saraiva. Era maio de 65. Nos bolsos, dezoito cruzeiros, uma carta de recomendação, que se revelaria inútil, e um endereço de um quase-parente que jamais procurei. Nos olhos, a poeira da estrada e o espanto diante do novo. No corpo inteiro, o medo latente.

______De cara, três surpresas. A primeira, preocupante: a quantidade de carros trafegando nas ruas.. Carecia tomar tento pra não voltar para a aldeia convertido em notícia ruim. A segunda, estimulante: a abundância (taí a palavra adequada!) de mulheres por toda parte. De onde eu vinha, só se via algo parecido no dia da procissão do Padroeiro. A terceira, elucidativa: o Parnaíba. O risco inexpressivo dos manuais de geografia, na verdade, era uma veia aberta, generosa, encharcando de vida a terra, os bichos e a gente do Piauí.

______Depois de zanzar por pensões ordinárias, atraquei na UPES (hoje, CCEP) onde já amontoavam outro náufragos. A casa poderia acomodar, com desconforto, dez pessoas. Éramos oitenta! Normalmente, faltava água e não havia um único banheiro, o que na verdade não fazia tanta falta, já que também não havia o que comer. "Deus só dá o frio..."

______Desbravar a cidade era um desafio. Na P2, as mulheres, como animais em exposição, circulavam graciosamente. Os homens, mãos no bolso para disfarçar, conferiam, aferiam, faziam propostas. No coreto, a bandinha da PM atacava de dobrados e marchinas, "programa de velho". Na parte alta, recrutas bolinavam curicas. Na Paissandu, a noite nunca envelhecia. Estrela, Amambay, Fascinação: boleros, varizes, cerveja e gonorréia. Eh, Antônio Leiteiro!

        No Clube dos Diários, a fina flor da burguesia embalava-se ao som do Barbosa Show Bossa em "tertúlias", onde havia um pouco de tudo: namoros, conchavos, negócios, jogatina. Como um cão de guarda, Marcelino conferia o pedigree de cada novo sócio e escorraçava os indesejáveis. E eu comendo com a testa.

______No Carnaúba, homens e ratos disputavam o mesmo espaço, com ligeira vantagem para estes que, na condição de provadores, beliscavam tudo sem pagar nada. No Flutuante, meninos entanguidos e piabas elétricas disputavam migalhas, sob o olhar complacente das lavadeiras seminuas. 

          Nos programas de calouros, Ruy - o primeiro cabeludo da cidade - fazia paródias geniais: "Garota de Timon nunca teve vez / Nem que seja bonita / Nem que fale inglês / Lá é tudo tinindo / E quem governa é o padre Delfino". Valdenir, com voz chorosa, cantava "Maria Helena", sempre "a pedidos". Nos saraus familiares, Silzinho e Assis Davys cantavam "Perfídia" com sotaque caribenho.

______Nos embalos jovens, Brasinhas, Metralhas, Sambrasa arrepiavam. Luz e cor: calça boca de sino, bota calhambeque, rum com coca-cola, minisaia de napa, milk-shake. Nas mãos afoitas e nervosas, passeavam inicentes baseados. "Me segura que eu vou dar um troço!"

 ______Nas emissoras de rádio, "o mundo em ondas sonoras". A. Tito Filho vertia cultura pelos poros; Ary Scherlock esbanjava glamour; Figueiredo fustigava os desafetos (todo mundo) com o seu Almanaquinho do Ar; Roque Moreira comandava o Seu Gosto na Berlinda; Mariquinha e Maricota estilavam veneno; Al Lebre enchia o saco de meio mundo com seu chocalho madrugador; Deoclécio Dantas e Carlos Augusto vergastavam políticos e delinquentes, e Dom Avelar, com sua autoridade de pastor, apacentava o rebanho com a "Oração por um dia feliz". Tudo tão Teresina!

______No Theatro 4 de Setembro, rolava tudo: Maciste, Tarzã, ídios, caubóis, tapas e beijos. No carnaval, realizavam-se os concorridos bailes promovidos pela Prefeitura, com direito a tombos no piso inclinado. Na Semana Santa, a exibição da indefectível "Tragédia do Gólgota" encenada por Santana e Silva. Nas página de O Dia, Fabrício Arêa Leão escrevia crônicas laudatórias em aramaico, enquanto Dona Elvira atiçava a "fogueira das vaidades" dos novos-ricos. Eh, cidade amada!

______No Lindolfo Monteiro, Gringo, Vilmar, Evandro e Sima agitavam a galera, enquanto Carlos Said desancava os "energúmenos" em linguagem tão pomposa, que muitos se sentiam lisonjeados. Mas o melhor mesmo era ofender a mãe do juiz, sabendo que ele estava ouvindo tudo. Te segura, Braz!

______E tão envolvido estava, que nem me dei conta de que a cidade crescia, inchava; cercada de favelas, prenhe de cursinhos, panificadoras, motéis, templos evangélicos, casa lotéricas, carros importados, mendigos, telefones celulares e o escambau... E aqui estou eu, bestamente, amando essa pobre cidade transitória, como se fosse a mais importante do mundo. E é!


cineas santos
campo formoso, caracol - pi / 1948
as despesas do envelhecer
teresina: corisco, 2001


Reflexão
Nenhuma cidade é a mesma para dois olhares diferentes, menos ainda quando se trata de Teresina, cidade marcada por violentos contrastes. A sede do novo faz da capital do Piauí uma “cidade transitória”, como bem acentuou Cineas Santos numa de suas crônicas.
Essa parece ter sido a preocupação do fotógrafo Paulo Tabatinga nas 20 fotografias que integram a exposição Luz e Sombra Sobre Teresina, na Oficina da Palavra, até o final do mês.  Com olhar aguçado e fina sensibilidade, o fotógrafo capta imagens que revelam a cidade provinciana sendo engolida pela “grande Teresina”, onde quintais são engolidos por supermercados e casarões transformados em estacionamento.  Mais que uma bela exposição, o trabalho de Tabatinga nos propõe uma reflexão sobre o destino da “cidade amada”.

Texto: Cineas Santos




Filme da Exposição:



Foto da Semana



Poemartemanhas

"REVELAÇÃO

Tão só,
A tua beleza fulgura entre todas
De longe escuto o teu nome
Calado dentro de mim
Como o seu palpitar
Que me afiança estar vivo
Pleno com a capacidade de amar-te.
Tão só,
O teu jeito, o teu riso
Entre as bocas adornadas de carmim
E tu dentro de mim
Como um órgão vital
Tu, a bela tão desigual.
Tão só,
Eu, que vou querer-te sempre
Como se afina, como se anima
A minha vida por já saber
Que esta será sempre a minha sina
Amar-te, tão distante de mim.

Naeno*comreservas"


Filosofando

Eu já nem lembro "pronde" mesmo que eu vou
Mas vou até o fim
                                  Chico Buarque




Haicai





Acontecendo em Teresina:

      Exposição fotográfica do fotógrafo Rogério Newton
      Local: Espaço Cultural São Francisco - Mafuá




domingo, 15 de abril de 2012

Engana-me que eu gosto

Rizzatto Nunes
De São Paulo

Existem várias versões para o significado da expressão "para inglês ver" e que remontam à sua origem. Uma delas diz que, em 1815, os portugueses e os britânicos firmaram um compromisso, no qual Portugal se comprometeu a não mais traficar escravos. Todavia, como Portugal não vinha cumprindo o compromisso, o Parlamento Britânico acabou aprovando uma lei que criminalizava a escravatura e concedia, unilateralmente, à frota real britânica poderes para abordar e inspecionar os navios portugueses. Como estratégia para enganar os ingleses, os portugueses carregavam a embarcação que ia à frente da frota com uma carga inofensiva para ser inspecionada, levando os escravos nos navios posteriores, que se safavam da inspeção.
Outra versão diz que, em 1831, o Governo Português promulgou uma lei proibindo o tráfico negreiro, mas como o sentimento geral era de que a lei não seria cumprida, começou a circular a expressão de que a lei fora feita apenas "para inglês ver".
E, ainda, outra versão diz que, após a partida da família real portuguesa para o Brasil, Portugal passou a ser uma espécie de protetorado da Inglaterra, que assumiu o comando da máquina militar lusitana na luta conjunta contra a França. Mas, os metódicos ingleses que queriam tudo organizado e por escrito tinham problemas com os práticos portugueses. Assim, a cada imposição organizacional inglesa, os portugueses botavam tudo por escrito, para mostrar que estava tudo em ordem. Mas, era só no papel. Servia apenas para agradar os ingleses e dizer que estava tudo arrumado, isto é, era só para os ingleses lerem (ou verem). Na prática, as coisas eram bem diferentes. O mesmo se dava nas visitas dos generais ingleses a certos locais, que eram preparados (maquiados, como hoje diríamos) para dar uma aparência diversa do real. Se os ingleses exigiam a construção de uma estrada, os portugueses deixavam pás, pedras e outros materiais no local da visita para simular a construção da mesma. Assim, diziam que já a estavam construindo. Era o que os ingleses viam. Ficou a expressão e o aprendizado. Mas, naquela época, consta que, de fato, os ingleses eram enganados.
Neste meu primeiro artigo do ano, abordo um assunto que, infelizmente, é básico quando se trata de relações de consumo: o das mentiras e toda sorte de enganações perpetradas por muitos fornecedores. Lembrarei também uma atitude de uma grande parcela de consumidores diante das mentiras - às vezes insultuosas: a da aquiescência pueril; aceitam o falso sem senso crítico, apenas porque ele tornou-se banal ou é bem produzido, bem comunicado ou apresentado por alguém que detém autoridade. Muitas delas, apenas para inglês ver.
A propósito, atualizando a expressão e usando uma outra um pouco modificada, refiro-me a um filme tipicamente hollywoodiano, que no Brasil ganhou o título de "Esposa de mentirinha", mas que em Portugal é intitulado "Engana-me que eu gosto". Trata-se de uma simpática comédia estrelada por Adam Sandler e Jennifer Aniston. Ele, depois de uma decepção amorosa, que impediu seu casamento, continua a usar uma aliança no dedo, dizendo-se casado e, com isso, conquista muitas garotas. Diz ele no filme: "Descobri o poder da aliança". Uma brincadeira, mas que, de todo modo, ilustra um fato importante: se de um lado a mentira pode ser conscientemente utilizada, de outro, muitas vezes, a pessoa enganada, estava mesmo interessada em sê-lo. Aceita a mentira porque lhe soa cômoda ou está de acordo com seu próprio interesse ou, ainda, porque não desenvolveu senso crítico capaz de percebê-la.
De há muito tempo que os consumeristas descobriram que um dos fundamentos da sociedade capitalista de consumo é a mentira. Largos setores empresariais são desonestos na relação com seus clientes, como, aliás, tenho mostrado em vários de meus artigos. Não há, claro, nenhuma novidade nisso. Quem conhece um pouco da história do comércio, da indústria, da economia etc sabe muito bem que os segredos, as artimanhas, os conchavos, os acertos escusos etc são a base da produção e distribuição de produtos e serviços. Transparência não é um termo conhecido ou utilizado e não porque alguém não queira ser transparente, mas simplesmente porque é da essência do modelo capitalista. Como diria Sócrates, a quem aqui já me referi, "mentir é pensar uma coisa e dizer outra". Parafraseando-o, posso dizer que no processo de produção capitalista faz-se muita coisa mas se mostra outra diferente.
Vejamos a ladainha das sacolas plásticas nos supermercados da cidade de São Paulo. Evidentemente, todos estão a favor de eliminar do mercado os produtos que causem danos ao meio ambiente. Quem pode estar contra? A questão não é essa. Como disse meu amigo Outrem Ego, "por que esse pessoal dos supermercados não veio a público e contou a verdade? Porque, simplesmente, não disseram: 'A partir de agora, os consumidores terão de pagar pelas sacolas para poderem levar suas compras'". "Será que precisava de tanto esforço? Fizeram lobby junto aos vereadores; aprovaram uma lei que dizia que seria para proteger o meio ambiente; sofreram derrota na Justiça e ao final fizeram o que queriam desde o início: impingiram o custo das sacolas aos consumidores". "O interessante", disse ele, "é que sempre passa o filme 'Engana-me que eu gosto'. Tem consumidor que acredita na versão, especialmente se ela vem travestida de boas intenções como, no caso, de proteção ao meio ambiente. Boa!". E meu amigo completou: "Estão dizendo para o consumidor ir ao supermercado com o carrinho de feira. Ora, se é para ir com carrinho de feira, melhor ir à feira".
Algumas mentiras tornam-se lugares comuns e de tantos serem utilizadas, a população passa a nelas acreditar, inclusive algumas expressões utilizadas regularmente. Por exemplo, é costume referir-se à indústria de veículos como a "indústria nacional de veículos". Ora, nós não temos indústria nacional de veículos. São todas estrangeiras, aqui estabelecidas, muitas delas com enormes incentivos e que, todos os anos, enviam para o exterior os gordos lucros obtidos. Talvez devêssemos mesmo é lamentar que não tenhamos um veículo nacional como têm os americanos, os franceses, os italianos, os japoneses, os alemães, os coreanos, os chineses e não ficarmos nos "orgulhando" de uma indústria que não é brasileira.
E, por falar nelas e no tema da verdade, lembro que os jornais dos últimos dias noticiaram que o setor remeteu às matrizes no exterior nada mais nada menos que cinco bilhões, quinhentos e oitenta milhões de dólares. Vou até repetir: US$5,58 bilhões! (Em 2010 não ficou muito longe. Foram US$4,1 bilhões). Para se poder ter uma ideia da dimensão desse quantum, veja-se que dá US$465 milhões por mês ou R$790.500.000/mês (usado o dólar a R$1,70). É mesmo muito dinheiro e que sai do suado trabalho e do salário dos brasileiros.
Vamos aos fatos: esse setor industrial "nacional" produz veículos cuja qualidade em termos de tecnologia de ponta está atrasada em relação a outros lugares do mundo e os vende a preços altíssimos. O que os empresários do setor falam? Vivem reclamando dos impostos cobrados, querem por que querem incentivos fiscais (e, aliás, conseguem), cobram financiamentos públicos baratos (e também conseguem), reclamam da falta de competitividade etc. Ora, ora, pois como diria meu amigo acima: senhores, sejam honestos. Vocês estão vendendo a altos preços produtos de tecnologia e conforto inferiores aos produzidos no exterior e obtendo lucros sensacionais.
A questão é que, essas versões surradas são enfiadas pela goela das pessoas e repetidas tantas vezes que soam como verdades. As pesquisas mostram que as pessoas se acostumam com as coisas rotineiras, comuns, banais e acabam aceitando-as como válidas e verdadeiras. Ou, então, aceitam os fatos como se eles não pudessem ser diferentes. Para usar mais um exemplo de meu amigo. Disse-me ele que só percebeu que a cidade de São Paulo era tão esburacada quando viajou pela primeira vez ao exterior. Já há muitos anos ele dirigiu mais de 1.000 quilômetros por ruas e estradas americanas e canadenses sem ter passado por nenhum buraco. Mas, foi só quando retornou à São Paulo que ele percebeu como nossas ruas são incrivelmente esburacadas, onduladas, e estragadas. Vale dizer, que sem alternativa ou jogados à própria sorte, as pessoas acabam aceitando as normas, o jeito do local que habitam, enfim o mundo em que vivem como se as coisas não pudessem ser de outro modo.
Quanto aos consumidores, estão tão absorvidos pelo mundo do marketing, da publicidade, das compras, que não conseguem se dar conta dos direitos que poderiam ter. Os consumidores vão sendo amaciados e tornam-se passivos na avaliação do real, acatando regras, contratos, imagens, textos como os ingleses do período acima citado ou pior, diante de uma realidade que, melhor avaliada, levaria à descoberta da verdade, acabam aceitando-a porque foram acostumados ao cômodo e inexorável andar das circunstâncias que não lhes pertence. Às vezes, claro, dela usufruindo, pois como diria a garota enganada pelo falso marido, "engana-me que eu gosto".

Rizzatto Nunes é mestre e doutor em Filosofia do Direito e livre-docente em Direito do Consumidor pela PUC/SP. É desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo. Autor de diversos livros, lançou recentemente "Superdicas para comprar bem e defender seus direitos de consumidor" (Editora Saraiva) e o romance "O abismo" (Editora da Praça).
 
 
Fotopoema
 


Foto Da Semana




Divulgação




Filosofando

O homem não tem razão para filosofar, exceto para atingir a felicidade.    Santo Agostinho


Poemartemanhas

SONETO PARA TERESINA

   ( Luiz Filho de Oliveira)

tristeresina: um quê de semelhante
estás ao que era nosso antigo estado
(rico de nativos mortos por gados)
em este mote alheio & cambiante

se a ti tocou-te a máquina mercado
esse ouro que apaga muito brilhante
a nós todos aqui tem-nos-tratado
com os dous ff dum poema dantes

deste estado – a quem não deste por renques
as carnes como o-fez à gente ruda
de Bahia Pernambuco Minas (mortes!) –

há quem alegoricamente tente
fazer ainda uma vaca bojuda
para carnes & poemas de corte

 
(De Oeiras, Salvador, Ouro Preto, Recife a Teresina, em estados de Brasil.)


* A Cineas, homem com letras, de cimos Sãos & Santos.

terça-feira, 29 de novembro de 2011

Relembrando a Banda

ANO DE 1966. ANO DO II FESTIVAL DE MÚSICA POPULAR BRASILEIRA DA TV RECORD (tendo como finalistas a "Banda" de Chico Buarque e Disparada de Theo de Barros e Geraldo Vandré.)

" A final aconteceu nma segunda-feira, 10 de outubro de 1966, no Teatro Record, que ficava na rua da Consolação. No auditório a platéia, dividida, gritava, balançando faixas e cartazes enquanto aguardava o resultado. Não menos tenso era o clima nos bastidores depois que Chico, percebendo - ou sabendo que venceria, sugeriu que houvesse empate entre as duas." e assim sendo, foram premiadas as duas. " cada uma das canções levou metade do premio que caberia ao primeiro lugar."  (Trecho do livro Chico Buarque de Wagner Homem)

Aproveito e transcrevo, aqui no bloque, essa belíssima crônica de Carlos Drummond.

".


"O jeito no momento é ver a banda passar, cantando coisa de amor. Pois de amor andamos todos precisados, em dose tal que nos alegre, nos reumanize, nos corrija, nos dê paciência e esperança, força, capacidade de entender, perdoar, ir para a frente. Amor que seja navio, casa, coisa cintilante, que nos vacine contra o feio, o errado, o triste, o mau, o absurdo e o mais que estamos vivendo ou presenciando.

A ordem, meus manos e desconhecidos meus, é abrir a janela, abrir não, escancará-la, é subir ao terraço como fez o velho que era fraco mais subiu assim mesmo, é correr à rua no rastro da meninada, e ver e ouvir a banda que passa. Viva a música, viva o sopro de amor que a música e a banda vêm trazendo, Chico Buarque de Holanda à frente, e que restaura em nós hipotecados palácios em ruínas, jardins pisoteados, cisternas secas, compensando-nos da confiança perdida nos homens e suas promessas, da perda dos sonhos que o desamor puiu e fixou, e que são agora como o paletó roído de traça, a pele escarificada de onde fugiu a beleza, o pó no ar, a falta de ar.

A felicidade geral com que foi recebida essa banda tão simples, tão brasileira e tão antiga na sua tradição lírica, que um rapaz de pouco mais de vinte anos botou na rua, alvoroçando novos e velhos, dá bem a ideia de como andávamos precisando de amor. Pois a banda não vem entoando marchas militares, nem a festejar com uma pirâmide de camélias e discursos as conquistas da violência. Esta banda é de amor, prefere rasgar corações, na receita do sábio maestro Anacleto de Medeiros, fazendo penetrar neles o fogo que arde sem se ver, o contentamento descontente, a dor que desatina sem doer, abrindo a ferida que dói e não se sente, como explicou um velho e imortal especialista português nessas matérias cordiais.

Meu partido está tomado. Não da Arena nem do MDB, sou desse partido congregacional e superior às classificações de emergência, que encontra na banda o remédio, a angra, o roteiro, a solução. Ele não obedece a cálculos da conveniência momentânea, não admite cassações nem acomodações para evitá-las, e principalmente não é um partido, mas o desejo, a vontade de compreender pelo amor, e de amar pela compreensão.


Se a banda sozinha faz a cidade toda se enfeitar e provoca até o aparecimento da lua cheia no céu confuso e soturno, crivado de signos ameaçadores, é porque há uma beleza generosa e solidária na banda, há uma indicação clara para todos os que têm responsabilidade de mandar e os que são mandados, os que estão contando dinheiro e os que não o têm para contar e muito menos para gastar, os espertos e os zangados, os vingativos e os ressentidos, os ambiciosos e todos, mas todos os etcéteras que eu poderia alinhar aqui se dispusesse da página inteira.

Coisas de amor são finezas que se oferecem a qualquer um que saiba cultivá-las, distribuí-las, começando por querer que elas floreçam. E não se limitam ao jardinzinho particular de afetos que cobre a área de nossa vida particular: abrangem terreno infinito, nas relações humanas, no país como entidade social carente de amor, no universo-mundo onde a voz do Papa soa como uma trompa longíngua, chamando o velho fraco, a moça feia, o homem sério, o faroleiro... todos os que viram a banda passar, e por uns minutos se sentiram melhores. E se o que era doce acabou, depois que a banda passou, que venha outra banda, Chico, e que nunca uma banda como essa deixe de musicar a alma da gente".



Foto da Semana


Foto: Paulo Tabatinga


Poemartemanhas

A PRAÇA É DO POVO!”
Não, meu poeta,
A praça é do bandido
Como o céu é do urubu   ( Paulo Tabatinga)



Filosofando

O mundo é um lugar perigoso de se viver, não por causa daqueles que fazem mal, mas sim, por causa daqueles que observam e deixam o mal acontecer.

Albert Einstein


Acontecendo em Teresina